Decerto que já estarão habituados à generalidade do termo: “Tomar, a cidade dos templários.”
Mas cá para mim, prefiro chamar a atenção para um outro lado: “A cidade de Gualdim Pais”.
Confusos?
Se sim, não há problema. Não sou Tomarense, mas vou tentar explicar o melhor que conseguir, com o detalhe que conseguir.

Como já sabem, este site servirá sempre para vos mostrar os outros ângulos da História, aquilo que não é tão comum saber. Esta é razão porque começo assim, salientando a sua extrema importância e introduzindo Gualdim Pais, um dos primeiros Grão-Mestre do Templários em Portugal e fundador da Cidade de Tomar, do Convento de Cristo e do Panteão Nacional dos Templários!
Neste capítulo irei dar destaque ao Panteão.
Enquadramento: Templários
Estamos em Novembro de 1095 e o Papa Urbano II acaba de realizar o Concilio de Clermont, França. Aqui conseguem recrutar a Nobreza e respetivos exércitos necessários para o passo que se dará a seguir: A 1ª Cruzada, em 1096.
Deste primeiro passo até à conquista de Jerusalém pelos Cruzados passam cerca de 3 anos, formando-se pela primeira vez o Reino Latino de Jerusalém em 1099, tendo como 1º Rei Balduíno de Bolonha. (Atenção, que esta designação Bolonha refere-se ao condado de Bolonha, na região da Flandres francesa e não à cidade de Bolonha em Itália. Também não confundir Bolonha com Borgonha, de onde é oriundo o conde D. Henrique, o pai de D. Afonso Henriques.)
Ora, avançando mais um pouco, são criadas ordens militares-religiosas com o intuito de protegerem os peregrinos cristãos na sua deslocação à terra Santa.
A uma delas é dado, em 1120, como quartel-general, um conjuntos de edifícios no Monte do Templo, em Jerusalém.
É neste local que é feita a alusão ao monte que possivelmente está sobre as ruínas do lendário Templo de Salomão, Rei dos Reinos unidos de Israel e da Judeia, cerca do ano 950 A.C. Por isso, avançando 2070 anos, estão criadas as condições para fundação da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, nome encurtado para Ordem do Templo ou Cavaleiros Templários, popularmente conhecida como Templários.

Então, onde anda o herói desta história?
(Eu bem vos disse que sou bastante metódico no que toca a História.)
Gualdim Pais
Ora, a fundação dos Templários dá-se em 1120 e o nosso Gualdim Pais nasce em 1118, na zona de Amares, hoje no distrito de Braga.
É de relembrar que o condado de Portucale é dado como prenda de casamente ao Conde D. Henrique e D. Teresa em 1096, que D. Afonso Henriques nasce, ainda hoje discutível, cerca do ano de 1106 e que o Conde D. Henrique morre 1112.
Com o passar dos anos, cresce a intriga e a discórdia entre Mãe e filho, até que D. Afonso Henriques rebele contra a sua Mãe e o poder que ela detinha. O filho vence o exército da Mãe na batalha de São Mamede em 1128, passando ele exclusivamente a tomar conta dos destinos do Condado.
É no contexto da senda posterior de expansão do território que os caminhos destes dois Heróis se cruzam, como se de uma qualquer série de televisão sobre exércitos e castelos se tratasse: Desde muito cedo que Gualdim ficou ao serviço do futuro Rei, combatendo a seu lado em todas as batalhas contra os Mouros. D. Afonso Henriques obtém a vitória decisiva contra o Império Almorávida na Batalha de Ourique, em 1139. É neste campo de batalha que Gualdim é armado cavaleiro por D. Afonso Henriques.
Avançando mais um pouco, Gualdim Pais junta-se à Ordem dos Templários e parte para Jerusalém. Mais tarde regressa a Portugal e perto do ano 1157, Gualdim é nomeado e torna-se 6º Grão-Mestre da Ordem dos Templários em Portugal, passados cerca de 30 anos desde a criação da “delegação” no nosso País.
Este marco mudaria para sempre uma região nas margens do rio Nabão.
Em 1160, o Grão-Mestre escolhe a região que passaria a ser denominada de Tomar, mais concretamente “Thomar”, para construir um novo castelo e convento, à imagem dos avanços tecnológicos que assistira na metrópole que se tornara Jerusalém. Dentro do Castelo de Tomar temos o famoso Património Mundial: O Convento de Cristo.

Agora que já fiz uma “pequena” introdução, já estou em condições de vos dizer que mais tarde irei falar destes tesouros monumentais, mas neste capitulo falarei de um que é descorado algumas vez, mas que para mim tem tanta importância como os demais.
Falo do Panteão dos Mestres Templários: a Igreja de Santa Maria do Olival.
Igreja de Santa Maria do Olival
Uma igreja primitiva terá sido edificada neste local por ordem de Gualdim Pais, por isso séc. XII, para sepultura dos membros da Ordem.
Assim, 1ª dica: desse templo primitivo, a única herança que temos é a arcada do portal virado a Norte.
A estrutura que hoje vemos advém de uma nova construção, pós - Gualdim Pais, já nos meados do séc. XIII, de forma a enaltecer ainda mais este Panteão Templário, tornando-o numa obra fantástica de arquitetura gótica mendicante.

A torre que vemos destacada da igreja é também muito antiga. Teria a função principal de atalaia e a sua fundação pode ser contemporânea da igreja primitiva ou até mesmo de tempos visigóticos.

O Panteão teria dupla função: último local de repouso dos membros da Ordem e local de iniciação para os admitidos no seio da Ordem. O tão precioso Grão-Mestre também aqui foi sepultado em 1195.
2ª dica: Na fachada principal, a Oeste, sobre o portal e sob a Rosácea, está o que parece ser uma estrela bastante danificada. Mas tendo em conta que estamos no Templo do Templários (lembram-se do que falei há pouco sobre as origens dos templários?), rapidamente associamos que aquilo não é bem uma estrela, mas sim um Hexagrama, “dois triângulos sobrepostos”, também conhecido por Estrela de David ou o Símbolo de Salomão, remetendo claro está, para os Cavaleiros do Templo de Salomão – Templários.

Entrando no Templo, damos de caras com o seu fantástico interior. Bem iluminado e decorado.
3ª dica – lembrar que neste templo eram sepultados os membros da Ordem, cada um no seu devido espaço e com as lápides tumulares por cima. Ora, muitos problemas existiram entre os Templários e a Igreja Católica. Sobre os detalhes destas intrigas poderei falar mais tarde, mas por agora posso relembrar que em 1536 deu início a Inquisição Portuguesa, durante o reinado de D. João III.
Esta Igreja acabou por sofrer a “remodelação” necessária aos olhos desta nova Instituição: Foram levantadas todas as lápides tumulares e retiradas as ossadas dos antigos Templários para outro local, “desimpedindo” assim o chão da Igreja.

Infelizmente, muita coisa aconteceu de errado no passado, só nos cabe a nós, no presente, aprender e olhar para o futuro, mas sem dúvida que uma parte da História Portuguesa foi extinta naquele preciso momento.
Hoje em dia, algumas das lápides tumulares que vemos no chão da Igreja já são do séc. XVI e XVII, de nobres e outras personalidades importantes na cidade de Tomar. Restam poucas lápides dos tempos da fundação, entre elas há a registar as dos Mestres Lourenço Martins e Gil Martins.
Mas para quem está a roer as unhas ai em casa e quer saber o que aconteceu à lápide de Gualdim Pais, pode estar descansado.
A lápide encontra-se embutida na parede de uma das capelas da Igreja, na sua perfeita inscrição gótica. Atravessou 825 anos de História para ainda estar aqui connosco!
E sim, posso ajudar a decifrar a inscrição. Aqui diz:
Obiit frater gvaldinvs magister militum templi portugalie E. MCCXXXIII, III.º idvs octobris. Hic castrvm Tomaris cum multis aliis popvlauit. Requiescat in pace. Amen.

Que se traduz em:
Morreu frei Gualdino, Mestre dos Cavaleiros do Templo em Portugal, na era de 1233, terceiro dos idos de Outubro. Este castelo de Tomar, com muitos outros, povoou. Descanse em paz. Ámen.
Ora, a pergunta que se faz logo é: 1233? então e o ano de 1195?
Resposta: ano 1233 (da era de César), ano 1195 (da era de Cristo). A era de Cristo só foi adotada em 1422 por D. João I.
Bem, já desvendamos um bom bocado de História, acho que por hoje podemos ficar por aqui.
Resta dizer que a Igreja de Santa Maria do Olival foi a Catedral de todas as Igrejas Matrizes dos territórios ultramarinos de Portugal na época dos descobrimentos, isto porque a herança desta Ordem esteve intimamente relacionada com os descobrimentos e com o Infante D. Henrique, mas isto serão conversas para outros capítulos.
Muito obrigado pela vossa presença.
Até breve.
André Cordeiro
